quarta-feira, 31 de outubro de 2012

RESENHA O PROCESSO - FRANZ KAFKA




Nota: 8,0

O Processo é um livro escrito pelo célebre escritor checo, Franz Kafka, lançado em 1925, um ano após a morte do autor.

Tido por muitos como um dos maiores romances do século XX, o enredo apresenta Josef K., um funcionário do alto escalão de um banco, que ao acordar no dia de seu aniversário de 30 anos se vê detido dentro da pensão onde mora, com dois vigias a sua guarda, monitorando seus movimentos e o impedindo de ir trabalhar. A princípio, K. pensa se tratar de uma brincadeira ou uma peça imposta pelos amigos do banco devido ao seu aniversário. No entanto, ao perceber a confusão em que se encontra, K. começa a se sentir incomodado e a exigir explicações sobre o que de fato estava acontecendo. Essa situação de indefinição e angústia de K. permeia toda a história.

Os dois vigias explicam a K. que também não sabem do que se trata, só estão cumprindo ordens. E que ele deveria aguardar maiores informações de um representante. Os vigias forçam K. a vestir sua melhor roupa ao ir de encontro com tal representante, porém ao indagar o mesmo sobre o porquê de tudo aquilo, K. é informado que está sendo processado, porém não é possível dar maiores detalhes sobre seu processo, como informações essenciais sobre o que ele está sendo acusado. De qualquer forma, K. deveria seguir sua vida social e profissional normalmente, enquanto respondia ao processo, comparecendo sempre que lhe fosse solicitado aos tribunais cabíveis.

K. vê a situação toda como um imenso absurdo e procura explicações dentro da pensão onde mora sobre o surreal fato ocorrido, porém sua inquilina a Sra. Grubach parece não querer conversar muito com ele, se mostrando por vezes condolente, por outras impaciente quando importunada por K. Já a outra moradora de quem K. se aproxima, Sra. Bürstner também se mostra pouco interessada em ajudar K., no entanto, ela lhe diz que trabalha num escritório de advocacia, o que muito lhe interessa, já que esta poderia auxiliá-lo no decorrer de seu misterioso processo. De qualquer forma, K. teve poucas chances de voltar a conversar com ambas senhoras e lhes deu cada vez menos atenção, muito devido ao fato das duas se mostrarem pouco solícitas a sua causa.

Durante o primeiro interrogatório, K. após alguma dificuldade em achar o lugar do tribunal, chegou sem saber também ao certo o horário em que deveria comparecer. O tribunal ficava numa espécie de cortiço, numa sala de difícil acesso, onde todos falavam alto, alguns de pé, outros sentados. K. ao se apresentar, é informado de que está atrasado, e fica revoltado, dando uma explicação muito revoltada sobre a forma absurda como foi acusado, a maneira confusa como estava sendo conduzido esse estranho processo e acusou a todos de quererem lhe extorquir, entre outras afirmações agressivas. A postura de K. deixa a todos atônitos, porém não tem o efeito que ele esperava, pelo contrário, ele recebe um sermão pelo comportamento hostil e é retirado do tribunal.

K. segue sua vida normalmente, até então, sem dar muita importância ao processo que está respondendo, já que não vê nenhum sentido no mesmo. Porém, as pessoas aos poucos vão sabendo da situação em que ele se encontra, o que passa a lhe incomodar profundamente, já que ele ocupa um cargo de confiança em um grande banco. A informação sobre o processo chega a um tio de K. chamado Karl, que mora numa cidade distante,  e se mostra bastante preocupado com a situação do sobrinho, muito mais que o próprio acusado. O tio procura convencer K. a dar maior atenção ao processo, pois este pode ser muito perigoso para o acusado e o aconselha a procurar um advogado. Ambos então se encaminham a um velho advogado, Sr. Huld, amigo do tio, que se encontra muito doente, de cama, mas por consideração ao amigo, topa representar K. no seu processo. No casa do advogado, K. conhece Leni, uma moça que toma conta do velho, com quem K. acaba tendo um caso.

Com o passar do tempo, K. passa a ficar cada vez mais angustiado quanto a definição de seu processo, pois a falta de informações, o difícil acesso e a morosidade do trabalho do advogado, fazem com que ele não consiga mais se concentrar na sua antiga rotina tanto social, quanto profissional. No trabalho, ele é subordinado de um diretor adjunto, com quem rola uma certa competição, porém cada vez mais debilitado psicologicamente pelo andamento de seu caso jurídico, cada vez mais abre espaço para o crescimento do seu superior. Fato que incomoda bastante a K.

Durante o atendimento de um cliente no banco, um industrial assíduo cliente, K. é surpreendido com o fato do mesmo saber que ele carrega consigo um processo. Porém, o cliente se mostra disposto a ajudar K., pois conhece um pintor que é muito próximo ao tribunal e que poderia ajudar K. no desenrolar do processo. Tal pintor realizava quadros dos próprios magistrados, juízes, advogados e afins, por isso tinha acesso aos figurões. O industrial passa o contato do tal pintor para K. que se mostra disposto a procura-lo assim que fosse possível.

K. vai em busca do pintor em seu atelier, que também se encontra numa localização esdrúxula, num quarto que foi dado a ele por altos magistrados. Após alguns melindros de K., o pintor Titorelli começa a dar algumas informações sobre como funcionam os andamentos dos processos e seus respectivos tribunais. Após o advogado apresentar a primeira petição – que o advogado ainda não tinha dado entrada – o processo seria analisado e as seguintes opções seriam apresentadas: o processo arrastado, que consiste em ir postergando o processo enfiado em toda sua burocracia, frequentando tribunais, ocasionalmente pagando propinas, contatando advogados e dispensando quase todo o tempo hábil ao desenrolar do processo; a absolvição aparente, que consistia na elaboração de um documento que o Titorelli levaria a um juiz que assinaria o documento e daria andamento no tribunal, porém a absolvição aparente tinha efeito temporário, pois quando alguém fosse rever o processo ele voltaria a tona, tornando necessário que se fizesse todo o procedimento novamente, além disso, com essa escolha a absolvição real se torna impossível; a outra possibilidade era a absolvição real, que era o total livramento de culpa e prosseguimento da vida normal do acusado. K. ficou muito atormentado diante das escassas possibilidades apresentadas pelo pintor, se vendo cada vez mais inserido num labirinto burocrático de incertezas e indefinições.

Diante de todo esse drama, K. decide por dispensar os serviços de seu advogado, que na visão de K. estava demorando muito a dar entrada na petição junto ao tribunal. Para K., o advogado não estava dando a devida atenção a seu caso, de forma que ele havia decidido ele próprio redigir a petição. Chegando à casa do advogado, ao ser recebido por Leni, toma um susto ao ver que há um homem aparentemente se envolvendo com ela, fato que deixa K. enciumado, esse homem se chama Rudi Block, um comerciante da região, que também carrega um processo e é representado pelo mesmo advogado que K. Após uma aproximação um tanto quanto hostil, eles se aproximam e começam a dialogar sobre os casos, o comerciante conta que responde o processo a muitos anos e atualmente, dedica seu tempo quase que exclusivamente a se defender perante os tribunais, tendo vendido quase todos seus bens, para levantar recursos financeiros para bancar todos custos processuais. Além disso, o comerciante possuía além daquele advogado, outros cinco que defendiam sua causa, o que causou estranheza a K. De qualquer forma, K. mesmo sendo aconselhado pelo comerciante e por Leni de não dispensar o advogado, ele se mostra decidido e efetua a dispensa do mesmo, apesar de tentar ser convencido por todos de que estava cometendo um grande erro.

No final do livro, K. vai a uma catedral encontrar um cliente, porém este não aparece e K. acaba se encontrando com um sacerdote, que trabalha para o tribunal e tem conhecimento sobre o processo de K. Ele passa um sermão em K., por ele não estar se dedicando como deveria ao processo, agindo de certa forma com prepotência diante da causa. K. já muito cansado ainda tenta extrair do sacerdote alguns pormenores, mas este, como todos os outros se mostra hostil e autoritário, num comportamento claramente favorável ao tribunal.

(Atenção Spoiler!)

No último capítulo, no seu aniversário de 31 anos, exatamente um ano após sua detenção na pensão e início da história, K. recebe dois caras, que ele descreve primeiro como atores, depois talvez tenores, devido a imensa papada de ambos. Os dois pegam K. e o levam entrelaçado pelo braço cruzando a cidade a pé, de modo que K. demonstra pouca resistência perante à situação, aparentando já saber o que lhe está reservado. Os dois se afastam do centro da cidade e após alguma hesitação, um dos homem enfia uma faca no peito de K. e dá duas voltas na mesma. A última fala de K. é: “Como um cão”.


Considerações Finais:

Franz Kafka tratava do absurdo em sua obra como poucos. O drama de K. parece um pesadelo e ele discorre muitas vezes as situações de uma maneira totalmente surreal. Com direito a tribunal num cortiço, advogado atendendo o cliente na cama e outras doideiras características do autor.

Se por um lado, a leitura se mostra difícil em alguns momentos, com conversações longas, que o autor usa pra decifrar ou complicar a história, por outro lado, o  desejo de decifrar os mistérios é maior e você se vê emaranhado no meio daquelas palavras, como se estivesse você próprio sendo processado.

Vale lembrar que O Processo é uma obra inacabada, que apesar de resgatada, possui diversos trechos riscados e capítulos incompletos que constam na edição do livro que li. De qualquer forma, ao que parece K. não queria que fosse desvendado o mistério em volta do processo que assombra K.

As interpretações são diversas, em zilhões de teorias e diversas linhas de raciocínio, com direito a obras lançadas exclusivamente com intuito de esmiuçar essa incrível teia de aranha escrita por Kafka. Entre as muitas teorias, alguns comparam o processo de K., ao modo como alguns religiosos fanáticos levam sua vida, sempre temendo por um julgamento divino, que não se sabe ao certo de que forma acontece; outros dizem que o intuito era mostrar como estamos sendo julgados pela sociedade que nos rodeia sem saber direito pelo que; outros falam que Kafka queria apenas demonstrar como o processo burocrático da justiça é falho e complexo, já que ele era formado em direito; há também quem acredite que K. realmente havia cometido algum crime e o autor simplesmente não revela qual é.

A possibilidade de tantas interpretações só evidencia o quanto essa obra é fascinante e justifica que ela tenha se tornado um clássico da literatura. Pois durante a leitura, é impossível não se envolver e até se identificar em alguns momentos angustiantes de K., desejando descobrir por que, afinal, K. está sendo processado. Nunca saberemos, talvez nem Kafka soubesse ao certo. O fato é que o mistério e as interpretações permanecerão por todos os tempos.



David Oaski



sexta-feira, 26 de outubro de 2012

TERRA FIRME



Poucas coisas realmente excitantes acontecem em terra firme. Quando digo terra firme quero dizer a zona de conforto, onde paira o comodismo, que por diversas vezes repousamos mais tempo do que deveríamos por medo de arriscar.

Quando damos a cara à tapa, podemos errar feio e ficar frustrados ou termos sucesso diante de uma boa iniciativa. Agora, se ficarmos parados, aí com certeza só o marasmo nos permeará.

A acomodação é um mal na vida do ser humano, mas quem nunca caiu na armadilha de se encostar num emprego, relacionamento ou qualquer outra situação, com o motivo de que poderia estar pior. Por isso, é preciso ficar atento para não perdermos nosso precioso tempo achando que por tudo estar relativamente em ordem, estamos no caminho certo. Muitas vezes quando despertamos, vemos o quanto de tempo estávamos desperdiçando com algo que não nos satisfazia. Enfim, o tempo é traiçoeiro.

O equilíbrio é o ideal em todas as circunstâncias na vida, se você sobe demais, o tombo é maior, por outro lado se desce demais, acaba se rebaixando, por isso temos que tentar manter a dosagem certa das coisas. Não que isso seja uma coisa fácil, não é, não somos imunes aos erros, mas temos que aprender com eles e não insistir nos mesmos, pois aí já é burrice.

Fique louco às vezes, se divirta, se permita, tome um porre, passe um pouco do limite. Sempre arcando com as consequências, e quando estiver em terra firme lembre-se que a zona de conforto pode se transformar num labirinto e o alto mar também pode ser perigoso, então caminhe nas duas zonas com convicção, fique no raso, mas vá fundo de vez em quando.



David Oaski


quinta-feira, 25 de outubro de 2012

NO DUST STUCK ON YOU - BLACK DRAWING CHALKS




Nota: 7,0

Quem ouviu a banda Black Drawing Chalks em meados de 2009, com o então recém lançado “Life is a Big Holiday for Us” certamente não imaginou que se tratasse de uma banda brasileira, pois as guitarras distorcidas, as melodias arrastadas e as letras em inglês certamente sugeriam que se tratasse de uma nova banda do Oregon ou da Califórnia.

Não era, por mais surreal que possa parecer, eles vem de Goiânia, capital do estado de Goiás, conhecido nacionalmente por revelar diversas duplas sertanejas, como Leandro e Leonardo e Zezé di Camargo e Luciano. Ao contrários dos conterrâneos, a banda faz um som pesado, que foi rapidamente rotulado como stoner rock, gênero popularizado no final da década de 90 pelo Queens of the Stone Age, mas já vinha reverberando desde o começo da década com o Kyuss e o Helmet, por exemplo.

Pra quem não sabe, o stoner rock (rock chapado, em tradução livre), possui como principais características os riffs de guitarra, pesados e arrastados, distorção, variação entre melodias rápidas e mais vagarosas, sempre com uma boa pitada de psicodelia. As raízes do estilo vêm principalmente dos anos 70, de bandas como Blue Cheer, Mountain, Lynyrd Skynyrd e o Grand Funk Railroad.

O Black Drawing Chalks foi formado em 2005 e os membros atuais são: Victor Rocha, guitarra e vocal; Edimar Filho, guitarra; Denis de Castro, baixo; e Douglas de Castro, bateria. A banda possui três álbuns lançados, todos pela Monstro Discos, o primeiro: “Big Deal”, de 2007; seguido do badalado “Life is a Big Holiday for Us”, de 2009; e o quarteto está de volta, com seu melhor trabalho até aqui, “No Dust Stuck On You”, que tentaremos esmiuçar nas linhas seguintes.

São quinze faixas de porrada na orelha, passando por grunge, stoner, pós grunge, resvalando no pop e quem sabe até no punk, mas sempre com canções de muita qualidade.


                                              Capa do álbum
                                             

Guitarras rápidas e os pratos da bateria anunciam a introdução de “Famous”, que abre o disco, anunciando o que está por vir. Victor entra cantando com seu timbre entre o rasgado e o agudo, bem característico. Letra e música são uma viagem quase lisérgica e por ter uma melodia rápida remete à vídeos de skate e esportes de ação. Cheira à adrenalina.

Em seguida vem o primeiro single, “Cut Myself in 2”, com a melodia arrastada, totalmente diferente da canção anterior. Possui uma pegada grunge (outra forte influência da banda) e remete a Soundgarden e algumas canções do Alice in Chains. “Street Rider” é suingada e com a melodia mais pop, um dos destaques do álbum, nessa eles citam um trecho do título: “...Riding, ain’t no dust stuck on me i’ll follow...”.





“Walking By” começa com uma linha de baixo e uma melodia mais soturna, lembra um pouco o new metal do Korn ou Deftones. A letra, como a maioria da banda, são devaneios, ora sacanas, ora chapados, sempre com aquela dose excelente de psicodelia. Já “No Anchor” é uma canção da década de 70, gravada em 2012, com a distorção alucinante da guitarra. “Disco Ghost” já tem a pegada mais stoner, com a melodia cheirando a asfalto na auto estrada, com muita cerveja e substâncias ilícitas. Possui um bom solo de guitarra.

O Queens of the Stone Age assinaria facilmente “I’ve Got Your Flavor”, pois a canção possui a melodia muito rápida e voz abafada, lembrando muito algumas gravações da banda de Josh Homme, muito pelo timbre das guitarras. Outro destaque do disco.

“Simmer Down” é outra porrada com um breve e ótimo solo e guitarras afiadas, enquanto “Swallow” inicia com um berro e o andamento da guitarra marca quase um heavy metal, porém a música balanceia entre o peso e a cadência, garantido pela coesão apresentada pela banda. “Immature Toy” segue a mesma linha, porém com mais distorção e um solo psicodélico. Na letra um garoto jovem fala de uma desilusão amorosa e se define como um brinquedo imaturo.

“Black Lines (I’ll Find a Way)” inicia com uma levada na bateria de Douglas que remete quase a um hardcore, depois cadencia, encorpa e é uma das melhores do disco. Essa lembra mais alguma banda de rock alternativo dos anos 90. “Little Crazy” é um encontro do grunge com a psicodelia, com um riff marcante, boa linha de baixo se alternando no destaque da canção, com a bateria marcando tudo e o vocal potente.

“The Stalker”, “Denis’s Dream” e “Cheat, Love and Lies” fecham o disco. A primeira mantém a pegada pesada, enquanto a segunda se desenvolve como uma marchinha e tem uma letra pequena que fala sobre vingança. A última faixa, novamente rápida e voraz, queimando o pneu e encerrando com o ótimo verso: “...tell me baby that i got a dream to survive”.

O Black Drawing Chalks juntou todas suas influências e fez além de seu disco mais pesado, seu melhor álbum até aqui. Vemos uma banda executando músicas enxutas, sem firulas, com técnica e precisão. Uma banda em ascensão, esbanjando talento, provando que a cena brasileira ainda possui sim bandas de qualidade e com propostas honestas.

Esse é um dos melhores discos lançados no Brasil até aqui esse ano, senão o melhor, produzido por uma banda que não deixa nada a desejar pra gringo nenhum.



David Oaski



terça-feira, 23 de outubro de 2012

A NOVIDADE QUE VALE A PENA: ALABAMA SHAKES



Fiz um post sobre o Black Keys com esse título um tempo atrás e resolvi ampliá-lo a uma sessão, onde pretendo apresentar a quem possa interessar novidades musicais que realmente valem a pena ser ouvidas e não essas porcarias indies que os críticos musicais tentam forçar goela abaixo como nova sensação da Europa ou de um festivalzinho no interior do Missouri.

Dando prosseguimento a sessão, falaremos do Alabama Shakes, excelente banda norte americana formada em 2009, pela vocalista e guitarrista Brittany Howard, pelo baixista Zac Cockrell e pelo baterista Steve Johnson, após o lançamento do primeiro EP fecharia a formação da banda, o guitarrista Heath Fogg.

O som da banda é uma mescla entre soul, r&b, pop, rock e blues, num caldeirão que funciona muito bem, bastante devido ao vozeirão de Brittany, que já foi comparada por algumas publicações a Janis Joplin. Realmente a cantora já pode ser considerada uma das melhores da atualidade, pois sua potência, afinação e feeling de transmitir exatamente o que a música pede são de uma eficácia impressionante para quem tem banda há apenas três anos.

O embrião do Alabama Shakes teve início na escola quando Brittany e Zac começaram a compor e tocar um som mais calcado no rock clássico e rock progressivo. Algum tempo depois, com a entrada de Steve, a banda que tocava covers de Led Zeppelin a Ottis Redding, começou a gravar demos, obtendo boa repercussão. Em Setembro de 2011, gravaram um EP, com quatro músicas, que foi o cartão de visitas da banda para entrar de vez no mainstream.

Em Abril desse ano, a banda lançou seu primeiro álbum, “Boys & Girls”, que saiu pela Rough Trade Records e os alavancou instantaneamente a sensação da música mundial. No disco, em diversos momentos, a banda soa como um artista vindo da década de 60, direto dos estúdios da Motown, com aquele climão triste, característico do blues, uma aura pesada nas canções, oriundo do soul e um poder arrebatador em cada faixa, tornando a audição marcante. Os primeiros singles do álbum foram: a cadenciada e bela “Hold On”, em que dá vontade de pegar uma garrafa de whisky, puxar uma cadeira e viajar no som; e a densa “I Ain’t Alone”, que esbanja melancolia em cada levada do acompanhamento de piano que há na canção. Foi lançado também um videoclipe para “I Ain’t the Same”, esta mais pop, com uma melodia mais ensolarada, sempre com performance vocal excelente de Brittany e acompanhamentos agradáveis na guitarra dela própria e de Fogg, com direito a um bom solo. Além dessas, também valem destaque, a pop “Hang Loose”, a rockabilly “Heavy Chevy” e a curtinha e ótima “Goin’ to the Party”.

                                                          Vídeoclipe de "Hold On"

O único pecado do Alabama talvez seja justamente pecar pelo excesso na utilização das influências do passado na composição desse disco, sem acrescentar personalidade própria ao som. Sob certo ponto de vista, é possível dizer que falta originalidade à banda, por soar em determinados momentos muito parecido a alguma banda ou artista dos anos 60 ou 70, mas creio que com a maturidade e sequencia de lançamentos a banda azeite seu som e crie uma sonoridade mais bem definida e moderna dentro de sua proposta.

De qualquer forma, vale muito a pena a audição desse disco e dessa banda, que além de entreter, esbanja talento e boas composições, com fontes no passado, mas que soam atuais ainda hoje. Além disso, talvez ao invés de soar datado, o Alabama Shakes seja tão bom que nem parece que foi gravado em 2012. Aguardemos o tempo determinar o lugar da banda na história, enquanto isso vamos curtindo esse belo primeiro álbum.


PS: Poderemos ver a banda em ação em Março do ano que vem, pois eles foram confirmados como uma das atrações secundárias do Lollapalooza Brasil 2013, na noite que terá como headliner o The Black Keys.




David Oaski

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

PÉROLAS QUE O TEMPO ESQUECEU: HANOI HANOI



Inauguro essa sessão aqui no blog, visando dar espaço a bandas e artistas que foram sucesso em determinada época e, por um motivo ou outro, caíram no esquecimento na cultura popular. Ou seja, tentamos resgatar a história de bons artistas que não estão tão próximos dos holofotes atualmente, pois sabemos que muito do que é sucesso hoje daqui a algum tempo não será lembrado e, muitas vezes, o motivo não é o fato de o som ser ruim e sim a falta de espaço na mídia, falta de carisma dos músicos, enfim, uma série de variáveis.

O primeiro artista / banda que falaremos será o Hanoi Hanoi, banda carioca, formada em 1985 pelo baixista e líder da banda: Arnaldo Brandão, que já havia sido membro da banda A Bolha e Banda Brylho, além de ter tocado nas bandas que acompanhavam Raul Seixas, Luiz Melodia, Gal Costa, entre outros. Os outros integrantes eram o guitarrista Afonso, o baterista Pena e Cássio, percussionista.


A maioria das letras da banda eram feitas por Arnaldo em parceria com o poeta Tavinho Paes, porém Arnaldo realizou parcerias antológicas com artistas que marcaram época, como é o caso de “O tempo não para”, com Cazuza e “Rádio Blá”, com Lobão, sendo que ambas fizeram sucesso absurdo nos anos 80. Além dessas, a canção “Totalmente Demais”, presente no primeiro disco da banda, foi regravada por Caetano Veloso, que lançou um álbum com o título da canção, em 1986.

Durante sua carreira, a banda lançou cinco álbuns: o disco homônimo, de 1986; “Fanzine”, de 1988; “O Ser e o Nada”, de 1990; “Coração Geiger”, de 1992; e “Credus”, de 1995. A banda nunca chegou a fazer parte do esquadrão classe A do rock nacional, mas fez algum sucesso em meados da década de 80, chegando a participar do Rock In Rio II, em 1991, em substituição ao Barão Vermelho.

A sonoridade da banda era calcada no rock, mas possuía influências de pop, reggae e, principalmente, funk, muito devido ao baixo suingado de Arnaldo. Ouvindo os discos da banda é impossível não se questionar como uma banda tão talentosa, com letras tão boas e sonoridade tão radiofônica não é lembrada nos dias de hoje, a conclusão que cheguei é que no momento em que a banda tinha tudo pra se firmar, no começo dos anos 90, após o Rock In Rio, o rock nacional perdeu espaço nas mídias para o sertanejo, pagode e afins, e a crise econômica dificultou muito a venda de discos no país, lembrando que na época os artistas eram totalmente dependentes das gravadoras, pois não havia internet, redes sociais, etc. Creio que a soma desses fatores tenha feito com que essa ótima banda nunca tenha recebido a devida atenção e valor.

O Hanoi Hanoi durou dez anos, encerrando as atividade em 1995, mas pelo que pesquisei, eles se reúnem periodicamente para shows, festas temáticas dos anos 80, flashbacks, etc. Arnaldo segue em carreira solo, lançando álbuns, além de ter um estúdio no Rio de Janeiro e ter lançado um projeto de resgate do O Bolha recentemente.

Não fosse a internet dificilmente conheceria essa banda, mas durante alguma pesquisa num Wikipedia da vida cliquei naqueles arquivos relacionados e por curiosidade baixei o disco “Fanzine” e não paro de ouvir desde então, as letras são algo como poesia urbana, que marcam um período pós repressão que o Brasil passava, de saber se a queda da ditadura era pra valer mesmo.

Bom, se você for curioso como eu e não ouve somente o que está na moda e toca nos rádios, corra atrás de material dessa banda, pois vale muito a pena, há talento e boas canções de sobra na discografia da banda.



David Oaski

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

KISS - MONSTER: O MONSTRO ESTÁ DE VOLTA



Nota: 8,0

Após três anos desde o lançamento de “Sonic Boom”, de 2009, uma das maiores bandas de rock de todos os tempos está de volta, transbordando vitalidade e rock n’ roll, os coroas das caras pintadas parecem não terem sentido o efeito do tempo e produziram um disco que parece ter saído da década de 70 e descido nos dias de hoje pronto pra farrear e mostrar pra molecada como é que se faz rock.

Esse é o vigésimo álbum de estúdio da banda e soa como os primeiros, é hardão de primeira, com guitarras afiadas, vocais agressivos, letras sacanas, refrãos marcantes e tudo que a banda sabe fazer de melhor, num disco muito bem produzido, com Paul Stanley assumindo de vez o comando criativo da banda, tendo produzido o disco com o auxílio de Greg Collins.

Grande parte da crítica especializada vinha desdenhando o lançamento dos caras, achando que possivelmente a banda seguiria a onda dos últimos álbuns, acomodados num som que só carrega a grife Kiss, mas acrescentava pouco à carreira da banda. No entanto, queimaram a língua, já que não se pode desmerecer em momento nenhum, artistas com tamanho talento como é o caso da banda norte americana.

O disco abre com o primeiro single “Hell or Hallelujah”, que conta com Paul Stanley nos vocais, e um ritmo alucinante. As guitarras de Tommy Thayer dão as cartas, entrelaçando com a base de Stanley, tudo harmonicamente no seu devido lugar, redondo. “Wall of Sound” é um hard mais cadenciado, com o linguarudo Gene Simmons nos vocais, um ótimo solo e acompanhamento ótimo do competente Eric Singer na bateria, músico que já tocou com o Black Sabbath e Alice Cooper (tá fraco o currículo do cara né?!).

A festa, digo o disco, segue com “Freak” e “Back to the Stone Age”, cantadas por Stanley e Simmons respectivamente, ambos com as vozes afiadas, diga-se de passagem, veremos ao vivo se eles conseguirão manter a pegada. As duas canções são ótimas, com letras pegajosas, aquela maneirada da banda antes do refrão, explodindo num mini coro, cantado a plenos pulmões, com partes quase faladas no meio da canção e novamente ótimos solos, principalmente a segunda. “Shout Mercy” tem uma pegada mais heavy metal, no andamento da guitarra, mas segue o padrão de qualidade do disco, com Stanley nos vocais.

O próximo single “Long Way Down”, poderia ter sido gravado por uma hairband dos anos 80, e tem uma pegada de hit, com Stanley nos vocais – por acaso ele canta nos dois primeiros singles. Se ainda houvesse rádios de rock seria sucesso garantido. Em “Eat Your Heart Out”, Simmons canta numa melodia com muito suingue, falando sobre as mulheres de um jeito que só ele sabe, sacana, mas sem forçar a barra. Novamente um grande solo de Thayer. Gene segue nos vocais em “The Devi lis Me”, um hard pesado, na linha ‘malvada’ do linguarudo, característica em extinção no marasmo de algumas bandas atuais.

“Outta This World” e “All for the Love of Rock & Roll” trazem Tommy Thayer e Eric Singer nos vocais principais, respectivamente. Na primeira, Thayer dá show, cantando muito bem, com um timbre parecido com o de Stanley, segura muito bem a bronca e deixa qualquer órfão de Ace Frehley saciado. A segunda é o que mais se aproxima de uma balada no álbum, com o baterista cantando de forma correta e como o nome da canção sugere é uma confissão de amor ao rock. O fato de termos quatro vozes diferentes no disco ao meu ver é ótimo, pois diversifica o play e o torna mais interessante ainda.

“Take Me Down Below” é minha preferida até agora e tem os vocais divididos entre Simmons e Stanley, seguindo o padrão versos no andamento, um pré refrão, seguido pelo ponto alto da música, com Stanley cantando a plenos pulmões o título da música, segue o solo e o ciclo se repete. Rock é simples, pra que complicar?

O disco fecha com “Last Chance”, cantada por Paul, com variações no andamento, mas mantendo o peso, encerrando com classe esse ótimo álbum de rock n’ roll.


Os monstros voltaram, com a mesma pegada de sempre, lançaram o melhor disco do ano até aqui, que ouso dizer que se fosse lançado nos anos 70 ou 80 seria considerado um clássico, mas nos dias de hoje, pode passar batido.

O rock é simples, sempre foi, de uns tempos pra cá chega a ser difícil encontrar uma banda que invista no seu som, tenha boas melodias e um disco com boas canções, é só isso que é preciso para lançar um bom disco de rock: talento, energia e feeling, e o Kiss sabe como poucos unir esses fatores. O disco é direto ao ponto, e que mal há nisso?

Quando somos crianças temos medo de monstros, depois crescemos e perdemos essa ingenuidade, ainda mais com esses monstros em cena, aí que não o que temer, basta apreciar
.
Prepare o som e ouça o disco, mas afaste as cadeiras, pois possivelmente você se pegará dançando entusiasmado no seu quarto se sentindo de volta à adolescência.



David Oaski

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

NÃO SE FAÇA DE VÍTIMA


Uma das piores coisas que se pode fazer com si próprio é se fazer de vítima diante das circunstâncias da vida. E vejo muitas pessoas fazerem isso, reclamando da sorte, das condições que a vida te trouxe, das circunstâncias ruins que nos encontramos em alguns momentos, no entanto a vida passa rápido demais pra ficarmos perdendo tempo com lamentações.

A auto piedade não leva a nada, a lugar algum. É como quem fica reclamando se está sol, se está chuva, se é segunda ou sábado, não faz diferença, a vida está aí, jogue com os dados que tem na mão, encontre a melhor forma de caminhar e a ponha em prática.

Claro que passamos por adversidades na vida, decepções, desilusões, e não são poucas, a vida é cíclica, você nunca está tão feliz que não possa ver o mundo cair, e nunca está tão no fundo do poço que não pode se reerguer. É a velha história, se cair, caia com classe, tire a poeira e volte a luta, se preciso tome um tempo de fôlego, mas nunca tenha pena de si próprio, reclamando de como teria sido diferente se fizesse do jeito x, y ou z. As coisas acontecem como acontecem, sofremos é claro, mas a culpa não é de ninguém, as peças estão dispostas da forma que estão e nem sempre podemos intervir nisso.

Gaste o tempo que você tem direcionado a se martirizar e reclamar da sorte com ações que realmente possam mudar sua situação, te tirar do marasmo e sacudir positivamente sua vida. Você tem duas opções: ser positivo ou ser negativo. E essa escolha influencia e muito no que vem pra você, pois muito do que se gera, retorna pra si próprio.

Disposição no lugar de acomodação. Sorrisos ocupando as tristezas. E lembre-se que positividade gera positividade.



David Oaski


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

REFLEXO


Pra toda ação que se tem há um reflexo

Pode estar certo disso

Por mais que não possua nexo

Há reflexo

Você não está livre da responsabilidade

Tudo requer sacrifícios

Independente da idade

Temos que saber por onde caminhar

Sem ser leviano, desonesto ou arrogante

Confiar, amar e, principalmente, respeitar

Sempre demonstrando paz no semblante

Com sede de vitória

Ambição e não ganância

Fazendo a própria história

Sem rancores ou desejo de vingança

Mas o mais importante mesmo é se aceitar

Ao olhar no espelho

Lembra do lance do reflexo, nexo e tudo mais

Se você estiver bem consigo mesmo

Então terá tudo que precisa, sua paz!



David Oaski

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

TOP 5: ROCK NACIONAL


O rock no Brasil começou a engatinhar com artistas que faziam versões de Elvis, Chuck Berry e afins. Anos depois, durante a Jovem Guarda, artistas como Renato e Seus Blue Caps, Jerry Adriani e Ronnie Von chegaram a flertar com o estilo, porém foram os Mutantes, banda formada por Rita Lee e os irmãos Batista que surgia o primeiro grande representante do rock nacional. Já nos anos 70, Raul Seixas também deu outro ânimo ao estilo, além de algumas bandas com características mais progressivas, como O Terço, A Bolha, etc, mas sem grande repercussão comercial nacionalmente falando. Foi somente nos anos 80 que o rock no Brasil realmente ganhou espaço, com diversas bandas talentosas teve seu momento de ouro, iniciando com o lançamento do primeiro disco da Blitz em 1982 até meados da década de 90, o rock viu suas melhores bandas produzindo discos que não devem nada a grandes nomes da música internacional.

Como já fiz a lista das minhas dez bandas preferidas dos Estados Unidos, resolvi dessa vez, listar minhas cinco bandas preferidas no rock nacional. Como foi dito daquela vez, listas são divertidas e interessantes, desde que não sejam levadas a ferro e fogo, além disso, são muito divertidas de serem elaboradas.

Segue meu top five:


Barão Vermelho

Como disse um amigo meu, eles são algo como os Rolling Stones brasileiros. A banda carioca formada em 1981 sempre se destacou pela essência rock n’ roll do seu som, com influências fortes de bandas da década de 60 e 70, como os citados Stones, The Who, Deep Purple, Led Zeppelin, entre outros. Ao contrário das outras bandas de sua geração que seguiram o caminho do pop dos anos oitenta, com sintetizadores e afins, o Barão sempre se manteve executando seu hard rock potente, flertando vezes com o blues, noutras com baladas românticas, mas sempre com grandes canções.

No início a banda contava com os vocais do carismático Cazuza, reconhecidamente um dos maiores compositores da música nacional, participou dos três primeiros discos da banda, que possuem clássicos do rock nacional, como “Bete Balanço”, “Pro Dia Nascer Feliz”, “Maior Abandonado” e “Todo Amor Que Houver Nessa Vida”.

Cazuza deixou a banda em meados de 1985, meses após a apresentação da banda no festival clássico Rock In Rio I, durante as gravações do quarto disco da banda. A saída não foi amigável, tendo o cantor rompido laços com a maioria dos integrantes durante um bom tempo, porém com o tempo inegavelmente a saída do vocalista se mostrou melhor para ambas as partes.

A banda sentiu muito a saída de seu front man e principal compositor, justamente na fase de preparação do novo disco, “Declare Guerra”, lançado em 1986. Com colaboração de compositores como Renato Russo e Arnaldo Antunes, o disco é ótimo, porém foi pouco trabalhado pela gravadora e obteve poucas vendas, porém nele estão músicas excelentes como “Bagatelas”, “Torre de Babel” e “Declare Guerra”.

Em 1987, a banda lança “Rock N’ Geral”, com maior participação dos membros no processo de composição, no entanto, apesar de ser um bom álbum e das boas críticas, vende apenas 25.000 cópias.

O voo só voltaria a aprumar no ano de 1988, com o lançamento de “Carnaval”, um dos grandes discos da década, com destaque para a faixa “Pense e Dance” que foi trilha da novela Vale Tudo. Em 1990, finalmente o Barão voltaria a ter destaque no cenário nacional, com o lançamento de “Na Calada da Noite”, com faixas como “O Poeta Está Vivo”, “Invejo os Bichos” e “Beijos de Arame Farpado”. Esse período marca a saída do baixista Dé (substituído por Dadi, ex Novos Baianos e A Cor do Som) e do tecladista e fundador da banda Maurício Barros.

Durante os anos noventa, a banda seguiria com destaque na mídia e sucesso comercial, flertando inclusive com a música eletrônica, como no álbum “Puro Êxtase”, de 1998. Já na década passada, a banda lançou entre diversas pausas nas atividades, somente um álbum homônimo, que gerou os singles “Cuidado” e “A Chave da Porta da Frente”, além do lançamento do cd e dvd “Mtv Ao Vivo”, relembrando sucessos de diversas fases da carreira. Além disso, os integrantes investiram em projetos paralelos, incluindo álbuns de sucesso de Frejat, esse que após toda incerteza deixada pela saída de Cazuza se consolidou como um dos melhores cantores e guitarristas do rock nacional.

O Barão Vermelho possui uma carreira de trinta anos e uma regularidade invejável, nenhum disco da carreira da banda é ruim, pois apesar das fases conturbadas a banda sempre criou boas canções, apelou a grandes letristas e mesmo os discos renegados à sua época hoje são tidos como clássicos. Eles conseguiram achar a linha tênue que separa o hard rock de qualidade do ridículo e mantiveram a qualidade sonora em todos os lançamentos da carreira.

Pra mim, a melhor banda da história do rock nacional.


Raimundos


“A vida me presenteou com dois primos já marmanjo, o muito justo era o Augusto e o safado era o Berssange, numa tarde ensolarada toda aquela criançada tomando um refrigerante”. Assim começa o primeiro disco dos Raimundos, com “Puteiro em João Pessoa”, o vocalista Rodolfo Abrantes conta uma história alucinada de como perdeu sua virgindade. A banda conquistaria uma geração com suas letras irreverentes e pornográficas.

A banda foi formada em Brasília no ano de 1987, pelo vocalista Rodolfo Abrantes, o guitarrista Digão e o baixista Canisso. Porém a banda não vai pra frente, devido aos integrantes estarem envolvidos em outras bandas e iniciando estudos. A volta da banda como atividade principal dos músicos só se daria em 1992, já com o baterista Fred na formação da banda, estava pronta a formação clássica da banda.

Desde o início, a banda se caracterizava pelas letras engraçadas, com muitas palavras chulas, comumente contando histórias bizarras escritas pelo vocalista Rodolfo. Outro elemento importante no som da banda era a influência nordestina, com algumas músicas dos dois primeiros discos flertando claramente com o forró, tendo inclusive participação do cantor do estilo Zenilton. Vale lembrar também, que a banda foi a primeira a falar abertamente do uso de maconha em suas letras.

O primeiro disco, homônimo, sairia em 1994, pelo selo Banguela, gerenciado pelos Titãs que participam inclusive da gravação e produção do disco. Já de cara, a banda mostrou a que veio, com um dos melhores discos de estreia de uma banda de rock nacional, pois continham hits do calibre de “Nega Jurema”, “Bê A Bá”, além da citada “Puteiro em João Pessoa” e “Selim”, uma balada que fala sobre vaginas e afins, essa última alavancou as vendas da banda, que chegaram a marca de 120.000 discos vendidos na época.

No segundo disco, Lavô Tá Novo, lançado em 1995, a banda assumiria de vez o lugar de destaque do rock nacional na década de 90. O álbum continha a clássica “Eu Quero Ver O Oco”, “Esporrei Na Manivela” e “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”, além disso, a banda começou a deixar menos em evidência a influência nordestina em comparação com o disco anterior, tendo somente “Tá Querendo Desquitar (Ela Tá Dando)” com essas características.

No álbum seguinte, “Lapadas do Povo”, de 1997, a banda já mais madura, tenta incluir letras mais sérias em seu repertório, com conteúdo social e letras mais sérias, tais como “Andar Na Pedra” e “Baile Funky”, no entanto o disco não repetiu o sucesso dos anteriores, fazendo com que a banda voltasse a irreverência com o lançamento seguinte.

Em 1999, a banda lançaria seu best seller, “Só No Forevis”, que continha a popularíssima “Mulher de Fases”, além dos sucessos “A Mais Pedida” e “Me Lambe”. Esse é o disco mais pop do Raimundos, não a toa o mais vendido e que pôs eles definitivamente em todas as rádios e programas do país.

Em 2001, quando a banda era a maior do Brasil, em meio a turnê do bem sucedido Mtv Ao Vivo, a banda anuncia seu fim, retornando meses depois sem o vocalista Rodolfo, que alegou que como compositor estava preso ao formato irreverente das músicas da banda e não se sentia mais a vontade em cantar as músicas da banda.

Desde então, em meio a imensas trocas na formação, o único que se manteve o tempo todo na banda foi o guitarrista Digão, que assumiu os vocais principais com a saída de Rodolfo da banda, houve lançamentos como o inconstante “Kavookavala” e o ep virtual “Ponto Qualquer Coisa”, mas sem a mesma repercussão dos tempos gloriosos.

A banda segue na ativa com Digão, Canisso, Marquim e Caio e recentemente lançou um dvd e cd ao vivo, relembrando os sucessos da banda com algumas músicas inéditas num projeto do canal Multi Show; lançou também um Split com o Ultraje A Rigor, onde uma banda faz versões de músicas da outra. Há previsão de um disco de inéditas a ser lançado entre esse ano e o próximo.

O Raimundos é um raro caso de banda que esteve no auge máximo da música pop e decaiu se tornando novamente independente, os integrantes seguem buscando reconquistar seu espaço e mostrar que podem sobreviver longe da sombra dos fãs carentes do Rodolfo.

Titãs

Banda paulistana formada em 1982, por nove músicos, que se conheceram entre bandas e escolas de São Paulo no final da década de 70.

Durante os trinta anos de carreira, a banda flertou entre diversos estilos musicais, entre eles, o funk (“O Que”), o punk (“Polícia”), o reggae (“Marvin”), new wave (“Insensível”), MPB (no disco acústico Mtv), entre outros, sempre com composições criativas e letras excelentes, fruto da colaboração das oito cabeças que unidas foram a formação clássica dos Titãs: Arnaldo Antunes (vocalista e grande compositor), Paulo Miklos (vocalista, compositor e multi instrumentista), Nando Reis (baixista e compositor), Marcelo Fromer (guitarrista e compositor), Sérgio Britto (tecladista e compositor), Branco Melo (vocalista e compositor), Tony Belotto (guitarrista e compositor) e Charles Gavin (baterista).

Devido a cada membro da banda ter um estilo de composição, os discos dos Titãs possuíam diversidade impar, com canções entrelaçadas, porém cada uma com uma característica principal, como a poesia torta de Arnaldo, as baladas pop de Nando ou os hits radiofônicos de Sérgio Britto. Eram oito caras mega inteligentes e criativos, produzindo música honesta, ou seja, dificilmente não daria certo, pois é, mas quase não deu.

A banda só foi obter sucesso e reconhecimento da crítica no seu terceiro disco, “Cabeça Dinossauro”, de 1986. Apesar de os dois primeiros discos terem gerados singles de relativo sucesso, como “Sonífera Ilha” e “Televisão” e outras canções que só fariam sucesso anos depois, como “Insensível” e “Marvin”, a banda não conseguiu emplacar e pintava como uma eterna promessa, porém após a prisão de Arnaldo Antunes e Tony Belotto em 1985, a banda se une e renova seu som, com letras politizadas e protestos sociais que abrangiam desde a polícia até a igreja, transformando a revolta em boa música, lança um dos melhores discos da história da música nacional, com composições e um disco que hoje em dia mais parece um Greatest Hits, a banda finalmente encontrava sua identidade e se afirmava como uma das grandes bandas do rock nacional.

Mantendo o ótimo nível, a banda lança em 1987, o disco “Jesus Não Tem Dentes No País Dos Banguelas”, que mantem o sucesso de seu antecessor, com hits como “Comida”, “Corações E Mentes”, “Diversão” e “Lugar Nenhum”, não deixou a peteca cair e novamente soa como uma coletânea, devido a imensidão de músicas conhecidas do álbum.

Dois anos depois, em 1989, os Titãs mudam consideravelmente seu estilo para o lançamento de “Õ Blésq Blom”, onde a banda se aproxima mais da MPB e tropicalismo em faixas como “Flores”, “O Pulso” e “Miséria”. Este disco, assim como o “Cabeça Dinossauro”, aparece em dez de dez listas dos melhores discos gravados no Brasil em todos os tempos.

Nos anos noventa, a banda se aproxima da sonoridade grunge, voltando a crueza de outros momentos e trabalhando com o produtor Jack Endino (Nirvana), tendo uma queda na popularidade no início da década, numa fase que marca também a saída de Arnaldo Antunes que visava se dedicar inteiramente a projetos solos. No entanto, a banda voltaria ao estrelato vendendo duas milhões de cópias de seu “Acústico Mtv”, de 1997, com versões mais acessíveis ao gosto popular de diversos clássicos da banda.

Na década passada, eles gravaram bons discos, como “A Melhor Banda de Todos Os Tempos Da Última Semana” e “Como Estão Vocês” e perderam Marcelo Fromer, falecido em 2001, vítima de um atropelamento e Nando Reis, em 2002, devido a problemas de relacionamento com os outros integrantes e a vontade de investir na carreira solo do músico.

Os Titãs seguem na ativa com quatro integrantes da formação original da banda e estão realizando uma turnê comemorativa ao 30 anos de banda, esbanjando vitalidade e rock n’ roll, é a banda mais versátil e criativa do rock nacional.



Legião Urbana

Banda de Brasília, formada em 1982, por Renato Russo (vocalista e compositor), Marcelo Bonfá (baterista) e posteriormente Dado Villa-Lobos (guitarrista) e Renato Rocha (baixista).

Após o final do Aborto Elétrico, Renato Russo sai pela cidade com seu violão num projeto chamado O Trovador Solitário, que dura pouco. Logo após, Renato chama Bonfá e dá início aos planos de formar uma banda que mudaria o mundo, a Legião Urbana.

Muito influenciado pelo rock britânico da época, com bandas como Joy Division, The Smiths, The Cure, Jesus & Mary Chain, Echo and The Bunnymen, entre outros, a Legião calcou seu som e se consolidou como uma das maiores bandas da história do rock nacional, tendo Renato se transformado num dos principais representantes de sua geração, sendo relatado comumente como um dos poetas do rock nacional.

Já no primeiro disco, de 1985, a banda mostrava a que veio, com letras de altíssimo nível para uma banda que estava começando e composições grudentas (no bom sentido), a Legião já se destacava do restante das bandas contemporâneas, tanto na sonoridade, quanto na característica vocal de Renato, além das letras serem politizadas, terem conteúdo social, questionamentos jovens, enfim, tratarem de tudo que a juventude passava naquele momento de transição que o país vivia. Ali já estavam singles do quilate de “Será”, “Ainda É Cedo” e “Geração Coca Cola”, pra se ter uma ideia.

A banda afastou o trauma do segundo disco, em 1986, lançando seu clássico mor, “Dois”, onde a banda se afirma no cenário nacional e passa a vender rios de discos, com as canções pop “Quase Sem Querer” e “Eduardo e Mônica”, as ‘britânicas’ “Daniel Na Cova dos Leões” e “Tempo Perdido”, a densa “Acrilic On Canvas” e a poesia brilhante de “Índios”, a banda conseguiria o que todos artistas desejam quando iniciam sua carreira, fizeram uma obra atemporal, que permanecerá pra sempre no imaginário pop nacional.

Em 1987, a banda lança mais como obrigação com a gravadora do que criação conceitual, o álbum “Que País É Esse 1978/1987”, que trazia composições de Renato nos tempos de Aborto Elétrico e músicas que haviam sobrado das gravações de “Dois”, que originalmente seria um álbum duplo. Apesar desse motivo, o disco também é um clássico, contendo as clássicas “Que País É Este” e “Faroeste Caboclo”, além das manjadas “Eu Sei” e “Angra dos Reis”. Novamente a banda mescla um resquício de sonoridade punk ao pós punk britânico, com canções pop acústicas, sempre com linhas de guitarra marcantes, característica imposta por Dado Villa-Lobos, que nunca foi brilhante tecnicamente, mas criou melodias que ao primeiro acorde já sabemos do que se trata.

Em 1989, após a saída conturbada do baixista Renato Rocha, a banda segue com sua formação como trio, como ficou eternizada, e lança “As Quatro Estações”, novamente fazendo um sucesso monstruoso, com direito a shows lotados em qualquer lugar que a banda passava. Puxavam o disco, dois dos maiores sucessos da banda: “Há Tempos” e “Pais e Filhos”, obrigatórias em qualquer roda de violão e luais a partir de então. Nesse álbum, a banda soa mais pop, com diversas canções com potencial radiofônico, com violões e levadas acústicas.

Dois anos após, em 1991, a banda lança “V”, um disco mais soturno e melancólico, que revelava o momento difícil que Renato passava, com seu vício em drogas e álcool e a descoberta da aids refletem o clima deprimente do disco. O disco vendeu “apenas” 700.000 cópias, um fracasso para os padrões da banda (bons tempos da indústria fonográfica hein). No álbum, não há nenhum clássico incontestável da banda, mas possui canções marcantes como “Vento no Litoral”, que foi regravada pela Cassia Eller, “O Mundo Anda Tão Complicado”, “Metal Contra As Nuvens” e “Teatro dos Vampiros” que anos mais tarde entrariam no repertório do “Acústico Mtv” da banda.

“O Descobrimento do Brasil”, lançado em 1993, teve como carro chefe “Perfeição”, que ganhou videoclipe e teve boa veiculação na Mtv. Nesse disco, a banda faz um som que mescla o pop com rock alternativo. Contém também a faixa preferida de Renato, “Giz”.

Em 1996, a banda lança “A Tempestade ou O Livro Dos Dias”, que traz em sua maioria, letras bastante depressivas e introspectivas, refletindo o momento que Renato vivia, já bastante debilitado pelo vírus HIV. Foi registrada apenas a voz guia nas gravações, sem as vozes definitivas e Renato não quis posar para fotos no encarte do álbum. A principal música do disco foi “A Via Láctea”, em que Renato aparentemente revela um dos seus dias durante essa fase, a letra é muito triste. Possui também “Dezesseis” que fala sobre rachas e está presente na coletânea “Mais do Mesmo”.

A banda ainda lançaria de maneira póstuma, o disco “Uma Outra Estação”. Originalmente o lançamento seria duplo, juntamente com seu antecessor, porém o projeto não foi aprovado pela gravadora. Ao contrário do anterior, as letras não são tão deprimentes, apesar da voz fragilizada de Renato.

A Legião Urbana é um daqueles casos típicos de ame ou odeie. Muita gente torce o nariz, outros são simplesmente fanáticos. Eu me encontro na ala dos que amam a banda, longe de ser fanático, mas considero fascinante a obra dessa banda, as melodias, as letras de Renato Russo, enfim, é uma das poucas bandas brasileiras que cada obra possui pormenores que você só descobre através de pesquisa e tudo mais, e não digo aqui de peripécias durante gravações, nem loucuras de músicos megalomaníacos, me refiro a música em si, ao play, as letras de Renato transmitiam emoções, sem qualquer tipo de forçamento de barra ou pieguice, bom “Ouça no Volume no Máximo”.


Chico Science e Nação Zumbi

Banda originalíssima formada em 1991, em Recife, trazendo consigo um som que mais tarde marcaria época intitulado de manguebeat, que foi um movimento criado por Chico Science, vocalista e líder da banda e Fred Zero Quatro, líder do Mundo Livre S/A, outra banda representante do movimento.

O som da banda era único até então na música nacional, com influências de Robertinho do Recife, a banda soube mesclar com perfeição rock, hip hop, maracatu e MPB, resultando numa sonoridade totalmente original e de boa qualidade, o que é mais importante. Além disso, a Nação Zumbi contava com uma formação fora do comum para uma banda na época, com alfais, tambores e todo um aparato de percussão, que trazia muito peso ao som. Outro destaque da banda sempre foi o guitarrista Lúcio Maia, um dos melhores do Brasil, sempre teve a técnica muito apurada, além de ser muito criativo. Isso sem falar nas letras, presença de palco e carisma do vocalista Chico Science, não fosse ele, talvez a banda nunca tivesse surgido aos holofotes do Brasil.

Com Chico na banda, só foram lançados dois álbuns, ambos clássicos absolutos da música nacional, o primeiro de 1994: “Da Lama Ao Caos”; e o segundo de 1996: “Afrociberdelia”. A carreira do promissor compositor foi interrompida em 1997, num acidente automobilístico.
Já no primeiro álbum, haviam clássicos como “A Cidade”, “A Praieira” e a faixa título, além de viagens – no melhor sentido da palavra – de Chico, como “Antene-se” e “Banditismo Por Uma Questão de Classe”. O álbum tinha o peso da percussão, os timbres sensacionais de Lúcio e as viagens sensacionais de Chico, difícil não gostar. É um daqueles álbuns indiscutíveis da música brasileira.

Em 1996, sairia o segundo álbum, “Afrociberdelia”, que seria o último registro em álbum de Chico Science. Neste a banda mantem a pegada do anterior, porém com canções ao meu ver, ainda melhores. São vinte canções excelentes, além de três versões de “Maracatu Atômico”, regravação do Jorge Mautner que fez muito sucesso, entre outras o disco tem “Macô” e “Manguetown”, num verdadeiro caldeirão sonoro, onde há de tudo, de funk a mpb, de ritmos africanos a ritmos tipicamente pernambucanos, além de rock e rap. Com a qualidade artística inata de Chico abençoando tudo.

Com a morte de Chico Science, Jorge Du Peixe, um dos percussionistas da banda, assumiu os vocais, tendo a banda mantido a sonoridade num primeiro momento, mas após alguns lançamentos se permitiu utilizar muitos recursos eletrônicos em seu som, através de samplers e sintetizadores. Já são cinco álbuns lançados desde o falecimento do antigo front man da banda, sendo que Jorge Du Peixe segurou bem a bronca, apesar de não ter o mesmo carisma de seu antecessor .

Os destaques da discografia da banda nesse período são “Nação Zumbi”, de 2002, “Futura”, de 2005 e “Fome de Tudo”, de 2007. Em todos eles, a banda se mostra afiada e entrosada, com composições pesadas e letras fortes, a banda segue muito original, bebendo em diversas fontes, sem nunca soar acomodada ou buscando lugares comuns na enormidade de seu som.

Num primeiro momento, a banda me soou cafona, no entanto, vi como estava completamente enganado, a Nação Zumbi, com ou sem Chico Science possui um som totalmente único no rock nacional, além de ter aquelas composições meio viajandonas, que você não entende muito bem, mas se amarra, falta essa ousadia nos artistas de hoje, afinal arte não é pra ser explicada e sim apreciada e aprecio muito o som dessa banda, que influenciou toda uma geração de bandas que viriam a seguir.



E essa é minha lista, critiquem, sugiram, elogiem, mas acima de tudo busquem conhecer os pormenores da discografia dessas bandas, pois elas valem muito a pena, já que cada uma ao seu estilo fez parte da vida de muitas pessoas e marcaram gerações.








David Oaski